sábado, 12 de janeiro de 2013

Malhoa e os “Salons” de Paris (V)


1900 – A Condessa de Paris

Não. Não se trata da d'Orléans, da pretendente ao trono gaulês, da mãezinha da Dona Amélia, da sogra estimada d’el-rei D. Carlos… não!
Tão sómente a Senhora Condessa de Mossamedes [1], retratada por Malhoa em 1899 e cuja tela ele enviou ao Salon de 1900. Esta é a Condessa que foi a Paris.


JMalhoa. Retrato da Ex.ma Sr.ª Condessa de Mossamedes, 1899.


Malhoa, em quatro momentos, deixa-nos indicações escritas sobre este retrato e suas andanças.
Anota a sua venda na «Receita» de Dezembro de 1899: «Recebi do Balthazar Cabral, pelo retrato que fiz a Condessa de Mossamedes – 120$000» e, na linha seguinte, «Importancia da moldura para o mesmo – 25$000».[2]
Regista, pela mesma altura, a data da sua feitura e algumas considerações sobre o seu mérito e destino: «…Pintei igualmente nos mezes de Novº e Dezembro o retrato da Condessa de Mossamedes, que muito tem agradado, e que eu conscienciosamente julgo sêr o unico que pode igualar em merecimento o retrato de Madª. Leal, que expus com tanto exito no “Salon” de 1897 junto com “Os Oleiros” e que tanto enthusiasmou foi celebrado pela imprensa Parisiense. Isto devido única e exclusivamente a modello têr a devida compreensão e pouzar-me bem. | José Malhôa | 31 Dezembro 1899[3]
Aponta, na «Despeza», o custo do envio do quadro a Paris: «Junho de 1900 | Despeza com a ida do retrato da Condessa de Mossamedes ao “Salon” – 17$640».

E, finalmente, anota no seu exemplar do Catalogue illustré du Salon, entre Malet e Mallet, a presença hors catalogue e o respectivo número «874a» do Retrato da Condessa de Mossamedes no Salon de 1900. Como se pode constatar aqui.


Tudo isto somado à indicação de The Studio, já anteriormente referida, «The Lecturer and The Priest of Constance were exhibited in 1899, and The Portrait of the Countess of Mossamedes in 1900» [4] deverá bastar para termos toda a certeza quanto ao quadro que Malhoa levou a Paris, ao Salon, em 1900. Este e não outro.

Pelo que podemos registar, finalmente,
Salon de Paris, 1900:

874a Retrato da Condessa 
             de Mossamedes, 1899.










Depois de Paris, o Retrato da Ex.ma Sr.ª Condessa de Mossamedes será apresentado em Lisboa, na 1ª Exposição da novel Sociedade Nacional de Bellas Artes, em 1901, com o nº 80 no catálogo. Só então, alguns comentários surgem na imprensa nacional:
«As honras da exposição cabem, sem duvida, a Malhôa, que se apresenta galhardamente. | Um dos seus melhores quadros é o retrato da sr.ª Condessa de Mossamedes, d’uma factura larga e solida, d’um magnifico desenho e côr sobria (nº80) [5]
«… temos Malhôa com os seus esplendidos retratos, que lhe valeram o ser premiado em Madrid, na terra dos mestres[6] [7]

Só em 1928, na Grande Exposição de Homenagem a José Malhoa, o retrato da Condessa aparece de novo, com o nº cat.137 e com a indicação da sua dimensão: 70x60.



E, para esturricar de vez As papas

Para que se perceba o que antes se disse [8], a propósito da errónea indicação de As papas como a obra presente neste Salon de 1900, fica a imagem publicada no Catálogo da Exposição de José Malhoa no Rio de Janeiro, em 1906.


Como se pode ver, este belíssimo estudo a carvão (com o boneco “da galinha e da poia” na margem direita do papel, possivelmente para diversão do pequeno Luiz ou da «Êta»), actualmente no acervo da Casa dos Patudos em Alpiarça, aparece com uma legenda completamente despropositada [9]
            Talvez aqui a origem do tal erro recorrente.



Eis o pormenor da galinha mais a poia.



12 Jan. 2013. LBG.


[1]  Que aqui nos é apresentada por Carlos Lobo d’Avila, meia dúzia de anos antes.  

[2] No ano seguinte, no mesmo dia 18 de Abril de 1900, aparecem mais estas três anotações, uma já antes referida, e aparentemente todas relacionadas com este personagem: «Retrato do pae do Balthazar Cabral c/ mª. 25.000 – 145$000», «Venda ao Balthazar Cabral do quadro “No forno” – 250$000» e «Retrato do Fº. Cabral Metello (moldura 25.000) – 140$000»

[3] Em nota de final de ano, em Dez. 1899, no seu livro de assentos «Receita | Despeza». Os sublinhados são do próprio JMalhoa. Está transcrito tal qual o original, apesar da linguagem confusa da penúltima frase.

[4] R.S. in The Studio. London, Aug. 15, 1905, vol.35. nº149. p.246. Sublinhado meu.

[5] Henrique de Vasconcellos, in Brasil-Portugal, nº 58, 16 Junho 1901, p.155.

[6] Xylographo, in Occidente, nº 807, 30 Maio 1901, p.118.

[7] Aqui haverá alguma ligeireza, infelizmente recorrente, do critico do Occidente. Nenhum dos retratos de Madrid estava ali exposto – um seria mostrado na SNBA no ano seguinte e só então premiado, o outro, o premiado em Madrid, só haveria de ser visto em Lisboa dois anos depois… É por estas e por outras que este Xylographo, por muitos considerado, a mim, canta bem, pouco me alegra.

[8]  Ver aqui, em particular a nota (4).

[9] Aliás, no referido catálogo da Exposição do Rio, 1906, aparecem mais algumas indicações que merecem cuidado e cautela. Desde logo, relembremos o aviso dado por Malhoa - «Cataloguei 112mas á ultima hora só pude levar commigo cento e quatro, por me tornar completamente impossível acabar os oito que faltavam». Depois, porque algumas obras aparecem com títulos diferentes do habitual dificultando a sua identificação (14- O viactico na aldeia, ou 29- Pae e filha, p. ex.). E surgem ainda outras imprecisões (como a legenda de 16- O azeite novo que o dá como medalhado em 1904, ou a indicação da presença da segunda versão de 24- Á passagem do combóio no Salon de 1905) que, em vez de boquiabrirem Seu Jaca, levam agora ao engano o Jaquim mais a Maria

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